quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Segui o caminho que a mim estava destinado

Segui o caminho que a mim estava destinado
Não fazia ideia do rumo que tomar
A indecisão tomou conta de mim
Mas segui o caminho que a mim estava destinado
Tentei seguir o trilho mais certo, mais adequado
Alcancei as estrelas
Desci às profundezas do mar, mergulhei na escuridão
Segui o caminho que a mim estava destinado
Não fui feliz, não fui triste. Não fui.
Quis ser.
Mas segui o caminho que a mim estava destinado
Tive sonhos. Uns realizei. Outros esqueci.
Alcancei. Por vezes desesperei. Temi, receei e cedi.
Segui o caminho que a mim estava destinado.
Tive medo de arriscar, de avançar. De ser feliz.
Medo de compreender, de amar. De lutar.
Medo de sentir. Tive medo de sentir.
Por isso, segui o caminho que a mim estava destinado.
Infeliz, mas o caminho que a mim estava destinado.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Fernando Pessoa entrevista Ricardo Reis

Embora, à partida, separados por interesses diferentes na vida, Eu e Ele estamos muito perto um do outro. As nossas idades têm apenas um ano de diferença, sendo que ele é mais velho, nasceu em 1887. Eu desde cedo me interessei pelas letras, no caso dele, bem, ele formou-se em medicina, mas apesar de tudo a poesia aproxima-nos, o gosto pelas letras é bem notório em ambos. Apresenta-se como um ser que não sente, mas sim um ser que pensa, por isso talvez possamos imaginá-lo frio e distante. Bem, quem melhor que o próprio para se dar a conhecer? Para isso ele está aqui comigo para responder a algumas perguntas que talvez nos ajudem a entendê-lo um pouco mais…

Ricardo, vamos começar de uma forma simples, consideras-te uma pessoa feliz ou triste?
“Não há tristezas, não há alegrias na nossa vida.”
(Mestre – Ricardo Reis)

Hum, e como achas que deve ser levada essa vida?
“Segue o teu destino. Rega as tuas plantas. Ama as tuas rosas. O resto é sombra de árvores alheias”. “Vê de longe a vida. Nunca a interrogues. Ela nada pode dizer-te. A resposta está para além dos Deuses”. (Segue o teu destino – Ricardo Reis)

O que pensas acerca do futuro, do teu futuro?
“Aguardo, com ânimo, o que não conheço – O meu futuro e o de tudo. No fim tudo será silêncio, salvo onde o mar banha nada.”
(Aguardo – Ricardo Reis)

Então, sem pensar no futuro, mas no teu dia-a-dia, como encaras o facto de existir a morte?
“Assim como é, gozemos o momento, solenes de alegria brevemente, e aguardando a morte como quem a conhecesse”. (Aguardo – Ricardo Reis)

Achas que existe comparação entre o sono e a morte?
“O sono é bom pois despertamos dele para saber o que é bom. Se a morte é sono despertamos dela; se não, não é sono.”
(O sono é bom – Ricardo Reis)

O que consideras existir acima de nós?
“Anjos ou Deuses, sempre nós tivemos, a visão perturbada de que acima de nós e compelindo-nos agem outras presenças.”
(Anjos ou deuses – Ricardo Reis)

Se pudesses, o que lhes pedirias?
“Aos deuses peço só me que concedam o nada lhes pedir”
(Aos Deuses - Ricardo Reis)

Recordas normalmente o passado? Sentes saudade?
“Se recordo quem fui, outrem me vejo, e o passado é o presente na lembrança. Quem fui é alguém que amo porém somente em sonho. E a saudade que me aflige a mente não é de mim nem do passado visto, senão de quem habito por trás dos olhos cegos. Nada senão o instante, me conhece. Minha mesma lembrança é nada, e sinto que quem sou e quem fui são sonhos diferentes.” (Se recordo – Ricardo Reis)

O que recordas do teu? Como foste nessa altura?
“Não sei de quem recordo meu passado que outrem fui, nem me conheço como sentindo com minha alma aquela alma que a sentir lembro.” “Somos quem somos, e o que fomos foi coisa vista por dentro” (Não sei – Ricardo Reis)

O destino, como achas que ele age?
“Nem da serva humilde se o destino esquece.”
(Nem da Serva – Ricardo Reis)

Para ti, qual a tua opinião sobre os quereres dos homens?
“Quem quer pouco, tem tudo; quem quer nada é livre; quem não tem, e não deseja, Homem, é igual aos deuses.”
(Não só quem nos odeia nos inveja – Ricardo Reis)

Sentes-te oprimido pelos que te odeiam ou pelos que te invejam?
“Só quem nos odeia ou nos inveja nos limita e oprime; quem nos ama não menos nos limita.” (Não só quem nos odeia nos inveja – Ricardo Reis)

Tens alguma história que os antigos te haviam contado e que queiras partilhar?
“Ouvi contar que outrora, quando a Pérsia tinha não sei qual guerra, quando a invasão ardia na cidade e as mulheres gritavam, dois jogadores de xadrez jogavam.” “Ardiam casas, saqueadas eram as arcas e as paredes, violadas, as mulheres eram postas contra os muros caídos, trespassadas de lanças, as crianças eram sangue nas ruas…mas onde estavam, perto da cidade, e longe do seu ruído, os jogadores de xadrez jogavam.” (Ouvi contar que outrora – Ricardo Reis)

Para ti o que é que sentimos?
“O que sentimos, não o que é sentido, é o que temos. Claro, o Inverno triste como à sorte o acolhamos. Haja Inverno na terra, não na mente. E, amor a amor, ou livro a livro, amemos nossa caveira breve.”
(O que sentimos – Ricardo Reis)

Qual é a tua opinião sobre o que é um sábio?
“Sábio é o que se contenta com o espectáculo do mundo, e ao beber nem recorda que já bebeu na vida, para quem tudo é novo .” (
Sábio – Ricardo Reis)

Podes me explicar a razão de considerares que não serás alguém?
“Sim, sei bem que nunca serei alguém. Sei de sobra que nunca terei uma obra. Sei, enfim, que nunca saberei de mim. Sim, mas agora, enquanto dura esta hora, este luar, estes ramos, esta paz em que estamos, deixem-me crer o que nunca poderei ser.” (Sim – Ricardo Reis)

Sei que tens uma relação especial com a Natureza, como comentas isso?
“Só o ter flores pela vista fora nas áleas largas dos jardins exactos basta para podermos achar a vida leve.” (Só o ter – Ricardo Reis)

Para finalizar em grande, Ricardo, julgas-te possuidor de mais que uma personalidade?
“Tenho mais almas que uma. Há mais eus do que eu mesmo. Existo todavia indiferente a todos. Faço-os calar: eu falo.” (Vivem em nós inúmeros – Ricardo Reis)