quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Calou

Olhou, rodou e parou. Sentiu. E tremeu.
Olhou o céu, e as aves, e o mar, e o sol.
Sentiu e Voltou a tremer.
Um calor no peito que lhe arrepiou o coração
Um impotente calafrio que lhe calou a voz.
E calou. Para sempre se calou.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Saber de onde vimos não é prioridade

Saber de onde vimos não é prioridade
Que interessa saber de onde vimos se não sabemos para onde vamos?
Vamos virar à esquerda, à direita. Alto, vamos em frente.
Mas e depois, qual o caminho?
Para onde sigo eu? Para onde segues tu? Para onde seguimos nós?
Eu sei que vim de trás. Não é mito. É certeza. Exacta e firme.
Mas que me interessa saber de onde vim, se não sei para onde vou?
Norte. Sul. Este e Aquele.
Não preciso de indicações. Não sabem onde quero ir.
Segue em frente. Esquece o caminho passado.
Mas, qual é o caminho que está de frente?
Eu posso me virar para qualquer direcção.
E, se isso acontecer, também não sigo em frente?
Sim, sigo.
Independentemente do rumo que tomar, seguirei sempre em frente.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Segui o caminho que a mim estava destinado

Segui o caminho que a mim estava destinado
Não fazia ideia do rumo que tomar
A indecisão tomou conta de mim
Mas segui o caminho que a mim estava destinado
Tentei seguir o trilho mais certo, mais adequado
Alcancei as estrelas
Desci às profundezas do mar, mergulhei na escuridão
Segui o caminho que a mim estava destinado
Não fui feliz, não fui triste. Não fui.
Quis ser.
Mas segui o caminho que a mim estava destinado
Tive sonhos. Uns realizei. Outros esqueci.
Alcancei. Por vezes desesperei. Temi, receei e cedi.
Segui o caminho que a mim estava destinado.
Tive medo de arriscar, de avançar. De ser feliz.
Medo de compreender, de amar. De lutar.
Medo de sentir. Tive medo de sentir.
Por isso, segui o caminho que a mim estava destinado.
Infeliz, mas o caminho que a mim estava destinado.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Fernando Pessoa entrevista Ricardo Reis

Embora, à partida, separados por interesses diferentes na vida, Eu e Ele estamos muito perto um do outro. As nossas idades têm apenas um ano de diferença, sendo que ele é mais velho, nasceu em 1887. Eu desde cedo me interessei pelas letras, no caso dele, bem, ele formou-se em medicina, mas apesar de tudo a poesia aproxima-nos, o gosto pelas letras é bem notório em ambos. Apresenta-se como um ser que não sente, mas sim um ser que pensa, por isso talvez possamos imaginá-lo frio e distante. Bem, quem melhor que o próprio para se dar a conhecer? Para isso ele está aqui comigo para responder a algumas perguntas que talvez nos ajudem a entendê-lo um pouco mais…

Ricardo, vamos começar de uma forma simples, consideras-te uma pessoa feliz ou triste?
“Não há tristezas, não há alegrias na nossa vida.”
(Mestre – Ricardo Reis)

Hum, e como achas que deve ser levada essa vida?
“Segue o teu destino. Rega as tuas plantas. Ama as tuas rosas. O resto é sombra de árvores alheias”. “Vê de longe a vida. Nunca a interrogues. Ela nada pode dizer-te. A resposta está para além dos Deuses”. (Segue o teu destino – Ricardo Reis)

O que pensas acerca do futuro, do teu futuro?
“Aguardo, com ânimo, o que não conheço – O meu futuro e o de tudo. No fim tudo será silêncio, salvo onde o mar banha nada.”
(Aguardo – Ricardo Reis)

Então, sem pensar no futuro, mas no teu dia-a-dia, como encaras o facto de existir a morte?
“Assim como é, gozemos o momento, solenes de alegria brevemente, e aguardando a morte como quem a conhecesse”. (Aguardo – Ricardo Reis)

Achas que existe comparação entre o sono e a morte?
“O sono é bom pois despertamos dele para saber o que é bom. Se a morte é sono despertamos dela; se não, não é sono.”
(O sono é bom – Ricardo Reis)

O que consideras existir acima de nós?
“Anjos ou Deuses, sempre nós tivemos, a visão perturbada de que acima de nós e compelindo-nos agem outras presenças.”
(Anjos ou deuses – Ricardo Reis)

Se pudesses, o que lhes pedirias?
“Aos deuses peço só me que concedam o nada lhes pedir”
(Aos Deuses - Ricardo Reis)

Recordas normalmente o passado? Sentes saudade?
“Se recordo quem fui, outrem me vejo, e o passado é o presente na lembrança. Quem fui é alguém que amo porém somente em sonho. E a saudade que me aflige a mente não é de mim nem do passado visto, senão de quem habito por trás dos olhos cegos. Nada senão o instante, me conhece. Minha mesma lembrança é nada, e sinto que quem sou e quem fui são sonhos diferentes.” (Se recordo – Ricardo Reis)

O que recordas do teu? Como foste nessa altura?
“Não sei de quem recordo meu passado que outrem fui, nem me conheço como sentindo com minha alma aquela alma que a sentir lembro.” “Somos quem somos, e o que fomos foi coisa vista por dentro” (Não sei – Ricardo Reis)

O destino, como achas que ele age?
“Nem da serva humilde se o destino esquece.”
(Nem da Serva – Ricardo Reis)

Para ti, qual a tua opinião sobre os quereres dos homens?
“Quem quer pouco, tem tudo; quem quer nada é livre; quem não tem, e não deseja, Homem, é igual aos deuses.”
(Não só quem nos odeia nos inveja – Ricardo Reis)

Sentes-te oprimido pelos que te odeiam ou pelos que te invejam?
“Só quem nos odeia ou nos inveja nos limita e oprime; quem nos ama não menos nos limita.” (Não só quem nos odeia nos inveja – Ricardo Reis)

Tens alguma história que os antigos te haviam contado e que queiras partilhar?
“Ouvi contar que outrora, quando a Pérsia tinha não sei qual guerra, quando a invasão ardia na cidade e as mulheres gritavam, dois jogadores de xadrez jogavam.” “Ardiam casas, saqueadas eram as arcas e as paredes, violadas, as mulheres eram postas contra os muros caídos, trespassadas de lanças, as crianças eram sangue nas ruas…mas onde estavam, perto da cidade, e longe do seu ruído, os jogadores de xadrez jogavam.” (Ouvi contar que outrora – Ricardo Reis)

Para ti o que é que sentimos?
“O que sentimos, não o que é sentido, é o que temos. Claro, o Inverno triste como à sorte o acolhamos. Haja Inverno na terra, não na mente. E, amor a amor, ou livro a livro, amemos nossa caveira breve.”
(O que sentimos – Ricardo Reis)

Qual é a tua opinião sobre o que é um sábio?
“Sábio é o que se contenta com o espectáculo do mundo, e ao beber nem recorda que já bebeu na vida, para quem tudo é novo .” (
Sábio – Ricardo Reis)

Podes me explicar a razão de considerares que não serás alguém?
“Sim, sei bem que nunca serei alguém. Sei de sobra que nunca terei uma obra. Sei, enfim, que nunca saberei de mim. Sim, mas agora, enquanto dura esta hora, este luar, estes ramos, esta paz em que estamos, deixem-me crer o que nunca poderei ser.” (Sim – Ricardo Reis)

Sei que tens uma relação especial com a Natureza, como comentas isso?
“Só o ter flores pela vista fora nas áleas largas dos jardins exactos basta para podermos achar a vida leve.” (Só o ter – Ricardo Reis)

Para finalizar em grande, Ricardo, julgas-te possuidor de mais que uma personalidade?
“Tenho mais almas que uma. Há mais eus do que eu mesmo. Existo todavia indiferente a todos. Faço-os calar: eu falo.” (Vivem em nós inúmeros – Ricardo Reis)

domingo, 16 de agosto de 2009

Vive

De pele escura e rosto sofrido lá estava ele. Com olhos castanhos inundados de saber. Mãos marcadas pela dor. Lábios condenados ao silêncio. O vestuário era próprio do seu tempo. Não do meu. Hoje é um simples velho como tantos outros perdidos pelas ruas da cidade ou do campo. Estão por toda a parte. A cada passo. Em cada esquina. Este é um simples velho marcado pelo tormento daquilo a que chamamos vida. Vida aqui é sofrimento. Tristeza. Angústia. Dor. Rancor. Medo. Arrependimento. Um dia foi alguém. Hoje é um ser faminto. Tem fome e sede. Fome de calor humano. Sede da vida. Fome do amor. Sede da paixão de viver. Hoje não é nada. Nunca o foi. Por sua culpa. Não teve sonhos. Ambições. Desejos. Pretensões. Pecou por isso. Viveu longe, bem longe. Num lugar chamado mentira. A mentira do amor. Do afecto. A mentira da família. A mentira chamada homem. A sua morada hoje chama-se solidão. Hoje está só. Não encarou a vida como uma flecha. Sempre acreditou que um dia poderia recuperar tudo. Ela não voltou. Está ali. Só. Teve nas suas mãos um instrumento que podia por ele ter sido tocado : o destino. Não aprendeu a tocar as suas próprias notas. Guiou-se pela música dos outros. Não foi autónomo. Incapaz. Está ali. Só. Olhou sempre para o futuro. Menosprezou o passado. Nada aprendeu. Deveria ter fitado a vida como um anteontem. Ter aprendido sempre com o passado do passado. Mas está ali. Só. Esteve ali ontem. Está lá hoje. Estará lá amanhã. Só. Este velho é intemporal. Não tem idade. Podes ser tu ou eu. Para que este velho não tenha o teu nome luta. Sofre. Ama. Chora. Ri. Pula. Brinca. Corre. Pragueja. Grita. Salta. Critica. Vive. Encara a vida e vive. Não te limites a existir, a sobreviver ou permanecer aqui e ali. Vive.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Era uma vez...

E raiava o sol, e as ondas, e o mar passava por entre as rochas. Ali estava Beatriz, este o seu nome, à espera. De algo, de alguém, não se sabe. Mas ali permaneceu a olhar, sem nada ver. A observar o mais ínfimo pormenor, mas sem nada alcançar. Era um dia ensolarado, e a doce brisa tocava a sua bela face, morena, queimada pelo sol, o seu cabelo castanho. Pensativa, calma e serena. Enfim, uma menina que não era mais uma menina. E aquele mar acalmava-a. Era na fúria das ondas que ela descarregava a sua raiva. Mas era na mesma fúria que ganhava forças para o resto, para a vida. Para a sua vida. Agora sim, podemos começar. Era uma vez uma rapariga chamada Beatriz e só ela poderá narrar o resto da sua história

Estou aqui

Estou aqui, perdido nesta imensidão de nada, desgarrado de tudo o que perturba o meu ser, a minha integridade, o meu ânimo. Sempre que afundo e a minh’alma naufraga, o meu pensamento sucumbe. Incessantemente procuro o trilho ideal para conduzir o meu cadáver, que por consequência levará o meu intimo a viajar para longe, bem longe. Por vezes a escolha da estrada é errada e o resultado disso é mais um desapontar, uma crença falhada. Seguir em frente aqui não é solução, em frente significa o caminho errado. Viro à esquerda, à direita, volto a trás. Novamente em frente. Neste lugar são inúmeras as escolhas que poderia tomar. Por mais que a escolha seja a correcta, serei sempre conduzido para o fundo. Estou condenado a viver amargamente entristecido por esta sorte. Ironicamente ou não, na verdade, não quero ser feliz, nem andar jubiloso pelas ruas, ficar radiante por amar, observar uma borboleta resplandecendo o seu encanto, alegrar-me com o canto das aves, por abraçar a vida. Não quero. Ser feliz não é prioridade. Trás preocupações e, como num ciclo vicioso, são inúmeros os sentimentos que a estas afluem. Não quero o caos nem a desordem, não à confusão nem à balbúrdia sentimental. Quero a vida assim, simples, triste mas simples. Estou aqui, perdido nesta imensidão de nada, desgarrado de tudo o que perturba o meu ser…

domingo, 2 de agosto de 2009

Hoje pensei escrever

Hoje pensei escrever um poema. Depois de tanto meditar, quiçá reflectir, nada rabisquei. Não sou um grande poeta, ou um grandioso escritor, muito menos um autor de pomposas obras. O que daqui sair não é fruto de inspiração, nem se deve a uma musa que me prende o fôlego ou me dá ânimo nos dias mais cinzentos. Escrevo quando estou triste, quando estou alegre, escrevo quando estou indiferente a tudo, a todos. Sou um simples mortal, que embora vivo, morreu para a morte. Se calhar hoje não vivo, apenas sou uma criatura vivente, que simplesmente subsiste ao infortúnio da existência, que se tornou na minha permanência, neste mundo de ausência, marcado pela existência de rimas em total decadência. Por vezes procuro a palavra certa, o parecer verdadeiro acerca do mundo, desde que o mundo se tornou mundo e eu me tornei eu, a expressão que exprima o meu ego. Sou um indivíduo com uma certa individualidade, uma identidade que me identifica. Na pluralidade das circunstâncias não sou aquilo que anseiam que seja, nem serei o que não tencionam que venha a ser. O ente que desejavam fitar, sucumbiu. Há quem insista em proferir que sou uma espécie de muralha, que enfrenta perigos de toda a sorte e é inabalável. Eu digo o contrário, sou atingível, e também gozo de algumas derrotas. Essas são uma pequena fracção da vida, da existência. São essas contrariedades que acontecem ao longo da nossa actividade por este mundo que faz com que acreditemos que tudo pode ser melhor. Termino aqui, bem diferente do que tinha principiado. Mas e daí?

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Voltarei a viver

Na incerteza da noite
Na escuridão do céu,
No silêncio das estrelas eu andei.
Procurei algo, um sinal, talvez um caminho.
O caminho.
Nada encontrei.
Busquei,
Bem no fundo da minha alma a resposta,
Como se ao inferno tivesse descido, e nada.
De repente a minha alma se encheu,
O meu espírito ficou leve
E meu fardo parecia menos pesado
O seu cabelo escuro,
A sua face branca como a neve,
Os seus olhos brilhantes, cor de mel.
A sua pele.
As suas mãos, as minhas mãos.
Regozijei-me perante aquele olhar.
Não sei o seu nome, a sua graça, nem nada.
Nada sei sobre aquela estrela trazida pelos céus.
Não importa.
É por aquele olhar que vou continuar a existir, subsistir
E quem sabe, um dia, voltarei a viver.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Leva meu Corpo

Os meus pensamentos são levados pelo vento
A cada segundo, a cada segundo
Voam, voam para bem longe.
Longe do meu entendimento, longe da minha força
Para longe dos sentimentos, das emoções.
Para um lugar escuro onde reina o medo e a solidão
Não sei o nome desse lugar nem o tenciono saber
Mas a tristeza invade minh'alma.
Procuro respostas para as certezas que nunca tive
Certezas que já não são verdades
Busco-me, por entre o cair das folhas do nobre sobreiro
Que me observa a vaguear pelo vazio, cheio de vazio
Silenciosamente procuro-me na maré alta, e na baixa
Nos cheiros e sabores da minha gente
Pelos caminhos que muitas vezes percorri
E percorro, e continuarei a percorrer,
Agora vazio, inundado de um infino vazio
Minh'alma está perdida, mas não sozinha
Com ela está o meu espírito
Os meus pensamentos a ela estão amarrados
De agora em diante o meu corpo não terá sentido.
Não consigo pensar nem amar nem chorar nem,
Nem consigo morrer.
Não consigo morrer.
Será o homem tão fraco, que nem morrer consegue?
Para encontrar minh' alma terei de morrer
Para me salvar terei de morrer
Oh vida cruel que os teus filhos levas sem pedires licença
Que lhes roubas o sentido daquilo a que chamam vida
És cruel e rude.
Vida madrasta
Leva-me.
Tira-me este sufoco, esta angustia
Acaba o trabalho que há muito começaste
Leva meu corpo. Leva meu corpo.

Lembrei o homem

Lembrei o homemAlinhar ao centro
Olhei em direcção ao mar:
Vi o ondular da maré,
Rochas isoladas,
Perdidas no oceano.
Lembrei o Homem!
Escutei o vento:
Ouvi o seu bramido,
Corria sem direcção.
Sem destino.
Lembrei o Homem!
Olhei o chão:
Vi uma cigarra,
Procurando alimento fácil.
Morreu de fome!
Lembrei o Homem!

Quem sou eu?




Quem sou eu?


Mas afinal quem sou eu?


Um dia quis saber quem sou eu.


Nunca o soube. Não o sei. Nem saberei.


Perguntei quem eu era,Negrito


Ninguém me respondeu.


Criei um novo eu!


Hoje sou diferente daquilo que fui.


Que fui? Como? Se eu nunca havia sido nada?


Pertinente ou não, esta dúvida me assolou.


Tenho um novo eu, este eu também não existe:


Não tem nome,


Não é pessoa,


Não tem alma,


Não tem vida,


Tal como eu.


Este eu será meu?


Este eu serei mesmo eu?


O eu que tanto busquei sou eu.


E se eu não tenho eu


O meu eu não é meu


Porque não é eu.


Mas afinal quem sou eu?